sábado, 29 de dezembro de 2012

o relógio

tique, tac, tarda o toque,
toque tic, tic, tac, no relógio
eu vou vendo o meu tempo acabar.

tic, tac, tac, tic, vamos logo, vamos nessa,
de repente estou vendo
a vida inteira passar.

tic, tac, tac, tic,
o relógio de repente dá defeito,
e o tempo não para de girar?

os ponteiros se reúnem,
cochichando coisas sujas,
logo, logo
meus olhos irão fechar.

e aí não tem conserto
as minhas engrenagens enferrujadas.

sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

precisão.

juntando os cacos todos, me reconstruí inteiro.
um riso pelo teu

um riso pelo teu,
assim, sem mais nem menos falei,
sentindo o aroma do verão e teus cabelos
perfumados em minhas mãos.
com a beleza pérfida de mil sóis brilhando intensamente
no calor do rio de janeiro.

um riso pelo teu,
eu disse assim, do nada,
revelando meus medos,
tendo em ti minha morada,
tendo a vida inteira pra lembrar.

uma risada, assim, bem calculada,
desenhada por zeus
e suas namoradas.
sorriso de ninfa
que integrava cada mito dessa minha
mitologia apaixonada.
fúria

BUM!
os anjos desceram na explosão
e as trombetas soaram nos quatro cantos,
a vida de repente se encheu de flores,
e todas as coisas viraram comédia,
e a tragédia ficou guardada nos corações
do deus (seja lá quem este for).

sim, corações.

um para cada pensamento ruim
depois da instauração da nova ordem.

segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

um conto de natal (e suas prioridades)

um dia eis que acordo com ar diferente,
algo em mim se sente em uma outra época,
acendo velas, faço mil pedidos,
e minha casa parece floresta
com uma árvore no meio da sala,
diversas frutas espalhadas pela mesa,
um sorriso em cada esquina.

vou atabalhoado me adaptando,
me acostumando a ser de outros tempos,
menos venenos, trabalhos, dilemas,
menos problemas que tenho de enfrentar,
ponho a enfeitar a casa, a família inteira,
sem eira nem beira podemos estar,
mas se uma bola brilhante puder pendurar,
sinto que o dia valerá e muito.

sem muito mesmo ainda me alongar,
faço um pedido que será meu último,
quero um natal para as crianças pobres,
e que esse não seja meu último,
mas se a morte quiser me levar,
desprevinido estarei e nu,
ou durante a ceia a me empanturrar,
me engasgando com pedaço de peru
aceito.

mas quando o sol nascer no outro dia,
esse amor sairá de meu peito,
estarei desfeito bem mais gordo e mau,
mas pensem pelo lado bom,
vai faltar nem dois meses para o carnaval!

sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

o trovão

a chuva lá fora arranhava a janela,
maria a menina na cama escondia,
seus mimos, brinquedos, bonecas,
suas velas e seus travesseiros,
sozinha em casa a menina,
chorava em seus desesperos,
os raios lá fora dançavam
uma requiem todo especial.

se enfatiota toda, maria!
a mãe disse ao telefone,
que mamãe já chega,
vou pegar o bonde
pra chegar mais rápido
ver minha menina
e esse trovão,
não pega minha filha!

ela obedeceu,
entrou no edredom,
levou um biscoitinho
e ligou a vitrola.

eis que um dia chuvoso
se torna uma festa,
e um trovãozinho
é igual ir pra escola.
eu brinco

eu brinco de escrever,
brinco de ter, ser, ler,
brinco de inventar,
hibernar em vários seres,
saberes e deveres que tenho e não sei fazer.

eu brinco de dizer que brinco,
tantas brincadeiras que eu me perco todo
nessa ciranda de doido,
almanaques loucos que leio sem entender.

brinco de ser intelectual,
pseudo, vigarista
o maioral,
tremendo enganador profissional
agenciador de palavras recém saidas de suas rimas.

quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

poesia de helena

antes de conhecer helena
eu já sentia saudade.
saudade de empurrar o carrinho,
saudade dos brinquedinhos,
saudades do sorrisinho
e dos domingos de farra.
saudades da alegria,
saudades dela de birra,
saudades dela e das amigas,
comendo brigadeiro de panela,
saudades de ser criança,
saudades de estar criança,
saudades de embrulhá-la quando tinha cólicas,
saudades de retribuir o que tanto helena me dá.
felicidade.

antes de saber de helena,
veio a menina serelepe com o teste na mão
e me deu a notícia.
a notícia que abalou o mundo,
a notícia do gosto de estar vivo,
a notícia de um novo ser vivo
que me deixaria mais vivo e com mais visão.
a notícia que jornal nenhum tinha em suas páginas,
a notícia que de sua boca, era mágica,
a notícia que me fez bem, mais que o bem em si.

antes de pegar helena,
venho dizer que tenho certeza,
nunca havia pego em algo tão frágil,
tão tenro e meigo,
tão mole e dependente de mim,
tão fiél e tão amigo,
tão querido e tão amado,
é tão fácil amar helena!
como é fácil,
vendo seus cabelos enrolados,
suas mãos sujas do chão empoeirado,
e seus pés negros de brincar o dia inteiro.

tenho medo de deixar helena para trás,
tenho medo do que pode acontecer,
medo dela não encontrar paz,
tenho medo que o próprio medo desfaz,
quando vejo seu sorriso uma vez mais,
quando eu vejo que sou sortudo e tenho ainda mais
que um bando de roupinhas antigas e lembranças esquecidas.

antes de existir helena
tinha saudade.
saudade de coisas que ainda não vivera,
saudade de uma vida que antes dela não fazia sentido,
que antes de vida, era frio e intenso escuro,
e ela trouxe aquilo tudo que eu sempre quis.

antes de existir helena,
eu era ela.
só não sabia que vindo de outra barriga,
helena, tão minha,
ia doer mais em mim a sua não presença.

terça-feira, 30 de outubro de 2012

no escuro

no escuro se escreve tudo
no escuro nós temos tudo o que queremos,
tudo que pensamos, vemos e sabemos,
no escuro me acho todo,
me perco,
meu endereço,
apreços,
e preços,
valores e cores,
dores e temores.

no escuro encontro um lugar,
um lugar todo escondido,
pronto pra eu poder chorar,
e jogar nele luz,
risco um giz no chão e apago com os pés,
tateio, busco lamparinas de razão e lâmpadas de emoção.

não há nada.

no escuro tem brincadeiras,
sexo,
no escuro fazemos festas a beça,
calçamos botas e saímos pela janela,
no escuro inventamos um cotidiano,
travamos duelos e construímos castelos,
fortes,
no escuro não temos medo da morte.
espuma

espuma branca lava teus cabelos,
espuma branca tira os meus beijos,
espuma branca lava as vaidades,
espuma branca leva meus desejos,
espuma branca limpa tiranias,
espuma branca deixa ideologias,
espuma branca causa minhas manias,
espuma branca me enche de agonias.
espuma branca só me arde os olhos
quando contemplo teu corpo molhado,
tomando banho os dois juntos em casa...

vejo a água lhe descer as curvas, nua,
espuma branca que lava minha'lma
e tu me e
               s
                 c
                   o
                      r
                        r
                           e

                                  a beleza tua.

quinta-feira, 25 de outubro de 2012

acho que...
 
acho que estou recarregando as baterias,
as surpresas do dia a dia,
as acentuações graves e as vozes agudas,
as moças mudas, diante a violência,
as ruas imundas mediante pagamento,
as costas largas devido ao tempo,
e o tempo curto que devo ao trabalho.
 
acho que minha vida se define só,
dois ônibus cheios e eu só o pó,
observando,
tentando me mostrar no esquecimento,
uma vez que sento, entra algum idoso,
uma mulher grávida,
alguém mais cansado,
se não levanto, chamam de malvado!
 
acho que se escrevo, não leio,
se leio,
mal junto as palavras,
as coisas,
uma dislexia moderna de ver sem sentir,
é o problema do povo,
uma flor vira um nojo
num poema moderno e descarado.
 
acho que tenho todo um charme,
cabelos coloridos,
queridos e amados,
armados em dia de chuva,
crespos na umidade,
que saudade das madeixas longas e lisas da semana passada.
hoje a tia da esquina guarda na lixeira do salão.
 
é isso,
simplicidade,
compro pão, faço amizades,
reclamo de dor,
sinto saudades,
aumento o som
para não escutar as vaidades
que me invadem.
 
acho que estou recarregado,
num poema longo te trago,
numa vista ao longe, te vejo,
num poema pobre, te beijo e me apego a um desejo
que me faça bem.

terça-feira, 23 de outubro de 2012

cabelo

lembro de cheiros, dengos, medos.
lembro de tudo um pouco,
lembro de tarde, lembro de cedo,
lembro de ir pra cama,
lembro de ser ninado,
lembro de estar sendo amado,
lembro de uma vida inteira,
sem eira nem beira sou,
mas beleza pouca vi,
beleza intensa, imensa, tremenda,
beleza linda, tão linda e tão cheia de si.

lembro de cabelos negros como jabuticabas
e você sorrindo pra mim.

a vida só me basta, simples assim.

sexta-feira, 12 de outubro de 2012


a fisiologia do pensamento

penso não invento,
no mais, não converso,
converto meus temas,
diversos poemas,
morfemas e lemas,
frases de efeito,
carrego no peito ideologias
quebradas, falhadas,
faladas e mortas,
sem luta, na luta
me inverto no inverso
subverto os congressos,
contradizendo defeitos,
tristezas
e vivendo em caretas.

penso não nego,
mas nêgo, não pensa
e negro me vejo,
no espelho me orgulho,
num pulo ressalto,
cultura no trago,
meu olho arregalo,
a olheira do sono,
não perco de vista,
sou nobre artista
a palavra me entrego
de verde, amarelo,
cores vivas,
cores,
eu corro em rios correntes,
preso as correntes e mentes
em estrofes gigantes.

penso e escrevo,
me embaralho, me calo,
me turvo, me fumo, me bebo,
me cravo no peito, na mente os enredos,
me escuto, me minto
me sou verdadeiro,
pensando eu adianto,
falando me esqueço...

quinta-feira, 11 de outubro de 2012

longe é um lugar que não existe

no aconchego das árvores,
sobre as tais copas,
as aves gargalham e temem o homem.
lá no alto, um atalho,
tranquilo, um ensaio,
para a vida e a morte.
alegria e calvário,
um voo secreto.
calminho e regresso,
voltando e virando as
asas ao contrário.

mas que tipo de ave haveria de ser,
e por quê estaria aqui sem dizer?
e de quê seria feito um ser
que não nos desse mais regozijo?
nessa rima horrível,
tanto desperdício,
algo que me dá prazer.

seria eu ave doente,
com asa dormente?
perigo de ser,
asa avariada, perdendo altitude e
caindo em você.

segunda-feira, 27 de agosto de 2012

uma casa em Frankfurt, um olhar do mundo

frente ao espelho vejo tudo o que vejo,
desejos, maus gostos, medos,
cabelos dóceis em dias de treva,
cabelos, nervos em dias de enterros.
tremendo fico de pé na varanda
à contemplar coisas mais sem sentido,
ouvir de perto gritos e ruidos,
ver de relance aquilo que me mata.

sobre as muletas um chão cor de fogo,
sobre as palpebras um mundo de muletas,
pesando nas ventas, marejando os olhos de velho.
entre as pernas entreabertas, arqueadas por doença, um cão,
bicho leal e são, ainda novo.
e lá fora os cães se matando aos poucos,
diz que é pelo povo, ou por religião.

frente a poltrona, um assento vazio,
sinto um arrepio que estremece o vão
entre a consciência e o passado.
não lembro, pois vago,
conhecendo ou não,
finjo ver, ter, até ser,
verbalizar e usar as palavras.
um chinelo velho,
preconceitos,
trejeitos de soldado idoso.

não quero essa história de homens com momentos sexuais com outros homens,
beijos, carícias amores,
me dão pavores de mãos dadas por aí.
e se?
é o contrário de e se não?
os negros hoje tomam conta de tudo,
empresários,
mal dormidos,
Mários, Valdomiros,
Pedros e Cirilos,
nomes e vagabundas em suas camas.

na certidão vejo Franz, no uniforme Hermann,
tremo de pensar em Ada,
que a febre me levou embora,
pensando só nessa hora,
uma lágrima caiu.

de que me vale quantos homens sofreram de minha faca o corte?
quantas mulheres sentiram meu membro forte,
quantas vezes ainda terei de pensar em Ada?

vi sangue e lágrimas,
e prometi a mim mesmo que novamente
não veria sangue e lágrimas.
prometi a mim mesmo muitas coisas.
prometi jamais morrer
prometi jamais perder,
prometi jamais ser vulgar,
prometi jamais amotinar,
esbofetear,
procriar,
aceitar,
tolerar,
não mais matar
nem olhar pra trás.
o tempo passa depressa demais
pra quem não tem pr'onde ir.
as pessoas pensam que é o contrário, mas não.
quando se tem tempo pra olhar em volta,
não bater mais as portas,
não gritar.
o tempo voa e não tem como voltar atrás.

o resto é só dor,
um teste de uma vida sem cor,
quem sobreviveria?
estampada em meu braço direito
a aranha da morte,
de quatro patas, cruzadas em cruz
toma o meu corpo inteiro,
me tinge de preto
me asfixia,
me toma de assalto e me anuncia,
um mundo renascerá.

onde aranhas e bichos peçonhentos
não passarão de poeira histórica
batendo à minha porta,
um vendedor chato
querendo arrumar confusão,
mas que seja sem isso
e eu viva de pão, não ódio de quem nem conheço,
os poucos anos que ainda me restam...
não me resta nada, então.

entro em casa, abro o armário,
busco minha velha arma e um pano,
começo a deixá-la brilhante, reluzindo como em outros tempos mais difíceis,
guardo o pano, puído,
o líquido enegrecido e tudo,
sento na poltrona, coloco as muletas de lado,
tiro o chinelo e desligo a caixa animada.
não gosto de ouvir vozes que não estejam perto, que não posso olhar no olho.
abro o robe, fico de cuecas, o cetim é inútil e o calor intenso.
apalpo o peito, dores estranhas,
tento dormir, não consigo, o cão latindo, nada o faz parar.
a sala roda, e volta a rodar depois de uma dose.

não...
definitivamente não mais,
não quero mais ser...fazer...
não...
não quero...
por favor...
não me obrigue, não...

acordo de um sonho ruim,
breve, mas suficiente.

aborrecido olho no relógio,
venho a sentir um cansaço incomum.
tendo ou não coisas a deixar, pra quem?
não tenho, porém,
no pente seis balas,
na mente acabada
não levo ninguém.

.

quarta-feira, 15 de agosto de 2012

o velho

o tempo de ser augusto se foi como a brisa da manhã,
gente sã já não se vê,
tenho uma flor em cada jardim,
um perfume sem fim,
eu sinto o vento batendo
aqui dentro
esquecendo de mim.

domingo, 22 de julho de 2012

exoterismos e misticismos de domingo


já que não podemos ser o que queremos,
que queiramos ser o que podemos,
de tempos em tempos num inverno frio,
em tempos que invernos  já não são tão frios
e roupas existem para ser rasgadas,
vidas feitas para serem tiradas,
amargas e de olhos fechados.


um tempo como o nosso
de verdades e mentiras
ditas da mesma forma,
não temos escolha.
ou vivemos ou não vivemos de acordo com as regras,
acumulando as mazelas de um tempo distante
que não cobra dívidas
mas assombra velhas vidas
enquanto assopramos feridas
de vidas novas e mais delicadas
que ainda não se devem ver ser vendas
nem respeitar as lendas escritas num quarto escuro de roma.


já que não se pode ser o que quiser,
que se seja o que se pode,
sem roupas de luxo,
charutos,
chás,
infusões,
chocolates meio amargos
e momentos cheios de minimalismos.
já que é essa a condição,
não se desespere em um uísque brazuca,
não saia bebendo verdades e vomitando 
as mentiras em cima dos estofados e tapetes,
não alimente vaidades e suspeitas,
seja ti, mi, e eles,
contentes ou descontentes feitos em desfeitas.


tenha a poesia presente,
a música,
a literatura de vestibular e a já formada há anos,
porque de tempos em tempos
um amigo há de chegar
e outro vai indo embora
sem nem perceber.

sexta-feira, 13 de julho de 2012


poesia anônima


tenho um mar de gente em mim,
gente forte, gente assim feliz,
veloz, atroz, gente como a gente,
que sente, que corre atrás,
que vai por mim
que vai, não vai.


tenho um bicho aqui dentro,
bicho carpinteiro,
quase me arrebento 
tentando saber o que tem que me invade,
me dá saúde,
verdade,
me dá desespero,
lances novos,
coisas velhas,
telhas e versos,
trecos,
coisas de flor e bem querer.


tenho o mundo em um lápis,
caneta,
sangue,
imagens,
alarde, arde
só de pensar o que me dá.
escrevo com tudo,
com tudo que der,
sou anônimo que sabe o que quer,
ninguém me conhece, 
nem há de saber,
o quanto é estranho saber tanto porquê.


me dá tanta saudade de quando era assim, 
viajando e caminhando sempre pro mesmo lugar.


ouço vozes na cabeça,
na memória encontro fatos,
me refaço em páginas,
sou um papel dobrado,
sou anônimo, enfático,
sou reumático e traumático,
de "áticos" e "ônimos"
faço meu nome.


(o sono sempre me traz motivos pra acordar).

quinta-feira, 12 de julho de 2012

ambientes e interiores

da janela da sala vejo romances,
nuances, cores,
amores e desamores,
morenas, sabores,
mortes e vidas sem vida
passando por debaixo da janela.
vejo cida, maria e gilda,
confabulando sobre o preço do pão,
não abrindo mão de seus trocados.

da janela da cozinha vejo e sinto cheiros,
passo fome, como bois inteiros,
depende do dia, depende da tia,
depende de boa vontade.
mendigo uns trocados,
como doces e amargos,
vejo alegria num café quentinho.

da janela do quarto vejo sexo,
sem nexo, intenso, tenso,
rostos quentes, silhuetas,
lunetas espionando,
olhares por todos os lados, cantos,
falo baixinho,
não acordo ninguém
com barulho de descarga.

da janela da alma
abro várias portas,
escancaro-me,
solto as maçanetas do pudor.
chaveiro sou,
entrando sem pedir,
saindo sem saber,
me desgraço em ter tantas chaves
e não saber em que porta bater.
nordeste mal retratado

numa cidadezinha de recife
alguém brinca de ser gente
antes do por-do-sol.
antes que venha o sol queimando as cabeças
e as esperanças.

naquela cidadezinha crianças corriam
vitoriosas de estarem ali,
simplesmente tendo ar e dor.

numa cidadezinha qualquer do recife
tem barulho de televisão sintonizando,
e o radinho velho toca alguma coisa.

é a vida chegando?
sonho

às vezes fico pensando
que nesse mundo só há fantasmas vivos,
livres são, mas com luvas de seda,
não tocam em nada, não creem,
não tem certezas,
nada são para qualquer manhã.
às vezes invento estórias,
conto,
reescrevo a história do mundo,
vislumbro um fim,
assim sem mais nem menos,
rabisco, escrevo,
me dou esses luxos todos,
não tenho modos,
vim para ficar.

às vezes tenho saudades,
de algo que dói o peito,
suja as mãos,
e limpa da testa beijada o batom,
simplesmente o tom de voz,
uma vila entranhada de valores estranhos.
uma vila de seres humanos,
onde se encontra o coração.

às vezes reecontro pessoas,
tão estranhas quanto um estranho.
não me identifico com todos,
sou anti social embaixo d'água,
atrás das portas,
paredes,
cores mortas,
sombras me invadem e saem de perto,
indivíduos, trajetos,
não lembro mais quem.

às vezes eu fico pensando,
que nesse mundo só há fantasmas vivos,
passeam arrastando correntes,
arrastando lembranças,
sujando mentes,
tão descrentes de si mesmos,
que existem, sim,
mas não vejo,
existente sou, em desprezo
a eles.

entre nós,
o que se passa na cabeça antes de dormir?
cosmogonia
às vezes penso que o mundo inteiro foi feito de mim,
um pedacinho aqui, outro ali, e ele foi feito assim.
na perfeição que hoje contemplamos
e vamos juntos assistir o fim,
estou chegando perto da minha explosão.

que se dane o mundo.
o bater das asas

um som baixinho eu ouço,
pousa a gaivota lá fora.
onde será que ela mora?
no céu que não é,
pois bate as asas mas também anda a pé!
quem será que viu a gaivota?
traz meu coração que nem mesmo voando a gaivota quer.
alegre

um rapaz faz comida para seu amor.
corta batatas, cebolas,
refoga as coisas,
joga no fogo,
põe a mesa e uma flor fica entre ele






e o abismo que é Carlos.
(se fosse Maria, todo mundo ia entender)
efemeridades, dívidas e vida

agora foi o velho Jorge,
ontem, o nestor da padaria,
meus pais só o pó,
na lápide os dizeres automáticos
e um caixão dividido à prestação.
às vezes parece que tudo vai morrer
menos eu.
e eu só posso mesmo insistir.

segunda-feira, 11 de junho de 2012


discordo


discordo da alegria
que entende ser minha quando não a quero.


discordo da tristeza toda 
que vem me cobrir a noite.


discordo das mesas de bar,
que tentaram levar meu amor e minha alma embora.


discordo do tempo que é curto
e me vejo esvair todo no espelho,
discordo tanto de não concordar com nada que me traz a vida.


discordo mais ainda por ser deturpado,
corrupto, aveludado,
medindo atitudes,
pisando em poemas,
jorrando palavras,
indo pelo ralo.

sexta-feira, 8 de junho de 2012


impessoal ou eu


me sinto bem,
me sinto woody allen
de óculos e nenhuma pretensão,
sem ter aonde ir e estar em todos os lugares,
vivendo e não rimando,
escrevendo peças,
ganhando tudo sem querer nada,
fazendo piada,
sendo gênio de bar,
falando pra quem quiser escutar
sem ter ninguém pra falar.


me sinto bem,
me sinto dave matthews,
calando quando se deve falar,
falando quando acaba de acordar,
falando ao coração,
ao estômago,
meio vivo, meio morto,
trancado em mil pensamentos.


me sinto bem,
ou não,
há quem diga, transtornado,
em cheque,
de pileque,
uma festa, um gesto sem fim de ok.


me sinto bem,
eu juro, não perguntem 
por mim pra ninguém,
achem-me em mim e virem-se,
ajudem, se acharem prudente,
não é pedido,
não sou carente,
se me entende
nas horas vagas e exatas do meu querer bem,
humores, tenho vários,
sapatos, tenho poucos,
ando descalço
ao encalço da alegria,
em camas de gente desconhecida,
mandando a vida pro caralho,
nunca fui amado,
mas já rimei amado com caralho e ninguém reclamou,
então vou indo.


me sinto bem,
hoje,
não ontem,
nem provavelmente amanhã,
mas até quando as lágrimas choradas asoberbarão (isso não existe)
as alegrias e risadas com as quais um dia já machuquei o abdômem
e hoje só machucam a mente de lembrar?
me sinto tão bem quanto você,
portanto não me venha dizer
até logo, se não pretende voltar,
não me diga adeus até ter a certeza de que na minha porta
já não bate mais a tua mão,
não me entregue seu coração a não ser que queira a mim machucar,
não me faça de bobo se não quiser apanhar,
não me leve em consideração
se não o fizer chorar.


[morra se vier com flores]

idoso


tento me libertar de coisas tão novas,
ser velho me inova,
me traz novas coisas,
novas esperanças,
novas vidas cruzam velhos caminhos
e se perdem no destino de serem lembranças,
sonhos lindos,
que só vivem pra acabar.


tento ser você um pouco,
um pouco de mim, um pouco assim,
assado,
prostrado, mal dormido e acabado,
razão do viver de alguém,
com mais de cem pessoas
sem perspectiva nas costas.


é a vontade de dizer que não te amo,
é a idade chegando,
é um caminho ou outro
sofro mudanças,
mas permaneço,
em essência,
em poemas, musicas e defeitos.


sou um vinil arranhado
tocando a mesma música boa de novo e de novo.


vou


estou em frenesi,
frenético,
frisado em cabelos embaraçados de negra,
cabelos lisos,
mulheres feias,
amando-as,
vivendo uma vida de céu.
darei tudo,
amor, dores, dívidas,
dou tudo que sou
mesmo sem tempo para procurar filosofia em coisas poucas.


mas não me deixei levar,
se me deixar, eu até vou sozinho
e caminho até a eternidade sem sentido.

dia dos namorados, não

não me canso de você
pois não há porque,
razão então qual é?
você, mulher,
é a verdade,
você namorada
é a cumplicidade,
você pessoa amada
é o que preciso,
sem virgulas, nem compromissos,
para ser a vida inteira omisso,
vivo e cheio de segredos.

sábado, 12 de maio de 2012

inspiração?

varia de pessoa pra pessoa
eu acho,
mas o que eu faço qualquer um pode fazer.

uma caneta e um pedaço de papel rasgado
é arma pra quem quiser expulsar um pouco de alma.
pra você

pra você que me atura um bocado,
pra você que já sofreu calado,
pra você que me viu arrasado,
magro,
embriagado,
pra você que merece uma estátua,
pra você que é natureza morta,
pra você que inventa um romance,
que bate palma na hora errada,
pra você que me chama de amado,
pra você que é um ser amado,
pra você que é um ser humano,
te dou a vida, tão desesperada,
tão desesperado eu invado o teu mundo,
tão exasperado te grito, te fumo,
te como, me esbarro em troços jogados,
rimados, cansados, sem profundidade,
sempre na viagem de te ter na cama,
redonda, quadrada,
cama, sempre a cama,
que guarda os amores
encara os armários,
nos vê sem pudores,
sempre desnudos e fracos,
cansados do dia,
dia de alegria,
viva a mente humana e suas temperanças,
minhas temperaturas altas,
minha doce vingança,
minha vivência cansa,
mas tenho você.

por você eu fecharia as pernas,
por você eu compraria flores,
por você eu escrevo poemas,
por você esqueço meus horrores,
seria tão bonito se fosse verdade,
por você até esqueci amizades,
coisas sem alarde,
cafés e bobagens,
biscoitos,
viagens de ônibus,
mortos,
sonhos.

por você me jogo mais pro alto,
por você ignoro a vida inteira,
por você me faço inteligente,
e durmo do lado esquerdo da cama.

até o amanhecer chegar,
e levar tua beleza.
tua pureza,
teus cabelos,
tuas manhas,
endereços,
interesses
tuas fronhas,
o teu cheiro,
suas artimanhas,
meu desejo,
então morremos juntos.

frustrações com passagem de tempo


tive vontades,
acordei, realizei,
voltei a dormir.
cansei de tentar ser quem sou,
um fantoche de meia,
botões no lugar dos olhos mortos,
ordens,
fotos,
cortes e recortes.


manipulado,
amarrado com a mão nas costas,
apostas.


tive vontades,
um dia,
sei que tive vontades,
me apaixonei,
eu sei!
não volta,
como me perdi em algumas vidas
e não volta,
como me esqueci entre chegadas e partidas.

quarta-feira, 2 de maio de 2012


mentiras colhidas, coração sofrido

tem que ser forte para plantar mentiras.
não, não digo que jamais fiz
e jamais direi que é errado,
mas tem que ser forte.
dia desses me peguei mentindo para aumentar,
uma mentirinha tola,
passei de bom à sensacional,
e a pessoa se encheu de alegria com o elogio,
frio como minhas mãos ao escrever este.
achou logo que tinha talento pra coisa e foi tentar a sorte no rio de janeiro,
resultado. uma vida arruinada por palavras doces.

querem outro exemplo?
pois vos dou agora mesmo!

uma poesia.
é uma mentira tão deslavada que produz sujeira,
não é capaz nem mesmo de esconder a poeira
de livros antigos e tapetes.

leia uma poesia para alguém.
e será um mentiroso cruel,
de fazer se apaixonar quem não queria ser incomodado,
despertar sentimentos ao invés de explorá-los,
cuspir no meu rosto e me dizer
te amo.

terça-feira, 1 de maio de 2012

o mais forte de todos, que todos queriam saber quando sairia OU prostituindo dilemas


sigo assim,
[como alguém me disse uma vez,
que tudo que vem do coração e dos dilemas
é facilmente encarnado em poesia,
desfruta logo de alma,
entranhas,
esqueleto,
tudo,
mudo,
tudo muda
assim do nada e vai embora.
mas decepções sempre voltam
e voltam,
e revoltam
mantendo acesa a chama pura que queima os pudores,
e você escreve,
escreve,
escreve,
se esquece de esquecer
ou sequer sequelar
e viver pra si.
é um rio corrente,
armadilha montada,
pronta pra arrancar-lhe a mão,
jogar-lhe no chão e aí tudo acaba.
parece forte, não?
um sentido sétimo ou oitavo,
não conto traços de caráter desviado
que já perdi no quinto verso].


vou assim,
prostituindo sentimentos,
meus demônios
sempre loucos e enfermos.
meu coração desconheço sem roupa provocante,
na rua a batalhar trocados.
um sexo, mereço.


sou da letra, agenciador,
sou do verso, maquiador,
sou da estrófe, figurinista,
sou da vida, uma puta.

filmes franceses e os pequenos prazeres


em um lugar pequeno
fico gigante de pensar.
quebro portas e janelas,
apago velas com a força da palavra,
que pode ser vaga,
disposta, aposto,
proporcionar alegrias,
alegar propostas ou insanidade.


em um lugar enorme
sou pequeno aos teus olhos,
vivo atento só pensando
quanto tempo estive atento
sem o amor encontrar.


o amor tem seus joguinhos
uma carta de alguém


prefiro poesias de armário,
sabe aquelas em sacos,
envelopes pardos,
versos magros,
quiça até chatos,
sem cor.
é aí que se esconde,
não sempre, só as vezes
a verdadeira beleza,
que por detrás da tristeza
mostra a cara e canta,
ainda tímida pro mundo
grita e se levanta!
coisas internas,
amor já gasto em poesias empoeiradas.
parece simples, mas não é.
arrumação

arrasta,
afasta,
vai, encaixa,
amassa,
corta,
passa,
lava,
limpa,
trava,
espaço,
não faço!
faço,
tá, faço!
olha,
acaba,
arruma,
empaca.
que saco!
pega o saco,
tá arrumado.

vai na cozinha,
pega um copo de leite,
senta no sofá limpinho,
bota o pé pra cima,
não me irrita!
pega o salgadinho,
come, faz farelo,
se distrai com a tv e
derrama o leite no chão.
pega o pano,
passa o pano,
pega a água,
joga a água,
joga,
embaça e desembaça,
torce o pano,
passa o papo,
que desgraça!

segunda-feira, 16 de abril de 2012

passagem

em brasa o pé,
entardecendo,
entrança, entrelaça
o triste traço de trégua
e acaba a paz!
em paz estou?
sem dor,
com aquela pontinha de esperança
tão peculiar aos medíocres assalariados
que travam batalhas por e contra eletrodomésticos.

em hora noite o crepúsculo cru
enegrece a poesia e tudo,
eu mudo,
mas mudo e surdo sou,
sem ler a vida
nem ter bolsos pra guardar alegria.

segunda-feira, 26 de março de 2012

escritor infâme

desculpe pela falta de talento,
falta de tato,
desalento,
falta de tudo
até entendo,
mas tinha que me fazer, ó zeus,
amante das palavras,
pra que pudesse, sem fim,
contemplar minhas merdas?

desculpe pela falta de respeito,
ajeito coisas aqui, acolá,
sempre sem medo de errar,
esse já sei ser o meu destino.

não se engane com meu jeito de te olhar,
não se jogue sem o medo de arriscar,
tenha prudência.

tenho vivência,
e até tento viver,
mas não dá.

sou falhado e cuspido,
exercido em triste existência,
mera falta de coincidência
dos criadores que não tem visão...

sou reticências
sem medo e amores,
cansei dos horrores que passei no chão.

sempre lento a entender, mais uma vez.

domingo, 25 de março de 2012

ouvinte e suas vantagens

as vezes quero ouvir alguém,
um segredo, uma coisa de alguém.
quem tem?

as vezes quero ouvir você,
um sussurro,
eu juro que quero,
não nego,
me entrego além da conta.

sei a hora de parar,
quebro garrafas,
me faço amar,
jogo com tudo
e contra tudo,
mudo, te tenho,
falante, já perco.

só sei ouvir,
e teu sexo aproveito assim.

domingo, 18 de março de 2012

cáfila

uma palavra nova,
um conceito,
um segredo,
um estreito,
uma estréia,
um começo,
uma novela,
loucura tanta,
sombra
jogado às traças,
às bombas.

lendo e relendo
resolvi montar
um texto usando o tão famigerado léxico.

comecei contando meus problemas,
cronique-se aliás, e conte-se,
faz bem.
não deu certo, não encaixei em nada a beleza da cáfila.

então fui pros anúncios de jornal,
procurando o dono da palavrinha mágica,
quem tinha inventado essa maravilha literária.
nada.
sem sucesso.

caí na poesia,
sem obrigações, rimas,
sem palhaçadas,
sem palavras feias,
feitas de trapos.
só pra descobrir e dizer que era um monte de camelos.