terça-feira, 24 de janeiro de 2012

o samba

tinha um samba antigo que eu escutava,
sempre que a vida me dava aflição.
não te contentes, neguinho,
com o que teus medos te trazem,
enfrenta e trate com carinho
a tua pretinha e os dengos que fazem
teus filhos, dizia,
e eu adorava.
acho que era do donga,
mas pouco importava.

o que a música te traz,
são lições virais,
pra vida bandida
e do que dela se tira.

desse samba tirava situações,
perdões, conselhos,
era completo como um samba enredo,
o enredo da minha vida,
cantava ele para minha filha
que tinha problemas no coração,
cantava ele pro meu filho
que já não está nesse mundão
tá por aí afora,
sendo anjo,
sendo visto,
um misto de sentimentos que esse samba dá.

era um samba do crioulo doido,
como dizia minha velha mãe,
e se um dia me sentisse 'pouco'
escutava o samba e me engrandecia,
e agradecia meus pais pelo bom gosto,
pagodinho e as revelações.
o samba é arte popular,
me faz guerreiro, independente,
esquecer meus tempos de carente
e dizer sem palavras, sempre com o pé
conheci uma mulata devassa,
debaixo das casas,
de paixão me mata
de mim dar no pé!

esse samba de mim tinha nome e sobrenome,
era vida e morte,
era querer bem.
e quando a morte vier me buscar,
irei sem reclamar,
vou me por a cantar
sentindo-me um viajante alegre
e sem rimas no bolso.

tinha um samba que eu escutava,
que me dava tudo e não me dava nada,
era só um samba,
não uma piada,
que gargalhava de mim e me gargalhava,
me fazia vivo e acreditava
que de samba o homem não vive,
mas pode sim criar homem melhor.

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

dúvidas, tenho muitas


por exemplo:


quem escreve besteiras pra sobreviver?
quem esquece asneiras que outros falaram?
quem viveu a vida inteira querendo viver?
quem enfrentou aquilo que foi complicado?
quem rosnou como um cão pra defender o melhor amigo?
quem dos seus amigos faria o mesmo?
quem venceu as adversidades e faria de novo?
quem espera alguém com espada e escudo a estender a mão?
quem começa a vida sabendo de tudo,
e quem vive começando a entender?
quem queria que o amor estivesse por perto?
quem fez por onde pra ele ficar?
quem correu atrás de alguém por tanto tempo
até perceber que não valia mais?
quem conservou e conversou com os pais,
pra no final ignorá-los?
quem joga damas no parque pra esquecer as frustrações?
quem está querendo morrer porque não dá valor a vida?
e quem joga com vidas por pura diversão?
quem criou o mundo inteiro
mas se esqueceu de criar o não?
quem travou ao falar em público
e na frente do espelho fala por duas horas em línguas desconhecidas?
quem viveu dentro de uma bolha a vida inteira sem ao menos ser doente?
quem tocou a campainha dos outros porque era engraçado?
quem conhecia realmente seus vizinhos?
quem fez sexo cedo demais e se arrependeu?
quem viu que se arrepender era o de menos e viu a barriga crescer?
quem amou os filhos mais do que a si mesmo?
quem chorou e xingou com notícias de crianças jogadas na lata do lixo?
quem já chorou pra deus só porque não tinha fé
quem te tomou por criança,
só pela casca de fora?
sem entender que o de dentro vale mais saber quem é.

perda

dia,
noite,
tanto faz.
quando a gente perde alguém
o tempo é desnecessário,
irrelevante,
vão.
os minutos,
as horas,
os dias,
as vidas,
tudo pára.
congela sem ela,
morre com ela.

quando a gente tem alguém
não pensa nessas coisas mínimas,
insuficientes ao perceber,
quase infladas de desimportância.

mas quando vem a saudade,
você vê que o tempo passou tão devagar,
que quando devia aproveitar,
tava se arrastando,
sem cor.

e a vida passa quase sem saber da existência de todo mundo.

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

a pior das saudades

de todas as saudades que eu sinto,
você é a pior.
aquela saudade que bate na porta,
senta-se a mesa,
dorme comigo
e vai embora.

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

vida dura


duas horas da manhã,
sem perspectiva,
sem vida,
deitado e olhando pro nada.


umas roupas antigas, casa antiga.


o ventilador roda devagar,
quase que anunciando uma tragédia.


livros espalhados,
um quarto sujo,
televisão ligada pra ninguém.
talvez pros antigos moradores e seus antepassados.


bagunça,
o piso descola do chão,
a cama é velha e feia,
o colchão de molas...dói as costas.


tudo indicaria que não é nada,
mas vibrando eu te afirmo.


não há vida melhor.
a morte do sonho de bosques, parques e rosa choque


tenho fé em mim, sabe?
como todos nós temos que ter
eu acredito.
acredito que um dia possa melhorar,
tudo irá ser como era.


um sonhador,
mas não sei ser outra coisa.
às vezes me pego pensando em como consegui me colocar nessa prisão.


sim, sonho é prisão,
não tem outra explicação.é uma bolinha de papel sendo arremessada pra longe.
onde vai parar não se sabe, a sorte foi lançada.
mas de um jeito ou de outro,
assim como a bolinha os sonhos caem.
e se atingirem o chão com muita força,
acabam por quebrar antigas percepções.


um sonho morreu.
junto com ele fui eu mais uns três, quatro.
umas cinco garrafas,
vazias, despedaçadas,
quebradas.


mais umas duas mortes, 
é preciso ter cuidado.


um sonho acaba de desabar.


é uma escolha.
quando eu amo eu amo de verdade.

mentiras bem contadas?
as vezes a gente precisa entender o que é amor.

mas eu amo de verdade.
só não sei se sou correspondido.
um belo teste pros meus medos.

uma vida inteira eu tenho pra chorar,
se não me quiser,
outras com certeza eu hei de conquistar,
quebrar encantos,
beijar sapos e princesas,
beber mulheres e transar com vinhos
num tom de embriaguez
uma cama redonda e espelhos no teto.

libidinoso sou,
mas aprendi com a vida que nem sempre podemos ser.

um tom de sobriedade, quase que misericordioso me toma a alma.

uma esperança.
quando eu amo eu amo de verdade,
sem prazeres, nem pudores.

quando a vida não se encontra mais em mim,
é porque você está longe.

viajou com meu coração dentro da mala.