domingo, 22 de julho de 2012

exoterismos e misticismos de domingo


já que não podemos ser o que queremos,
que queiramos ser o que podemos,
de tempos em tempos num inverno frio,
em tempos que invernos  já não são tão frios
e roupas existem para ser rasgadas,
vidas feitas para serem tiradas,
amargas e de olhos fechados.


um tempo como o nosso
de verdades e mentiras
ditas da mesma forma,
não temos escolha.
ou vivemos ou não vivemos de acordo com as regras,
acumulando as mazelas de um tempo distante
que não cobra dívidas
mas assombra velhas vidas
enquanto assopramos feridas
de vidas novas e mais delicadas
que ainda não se devem ver ser vendas
nem respeitar as lendas escritas num quarto escuro de roma.


já que não se pode ser o que quiser,
que se seja o que se pode,
sem roupas de luxo,
charutos,
chás,
infusões,
chocolates meio amargos
e momentos cheios de minimalismos.
já que é essa a condição,
não se desespere em um uísque brazuca,
não saia bebendo verdades e vomitando 
as mentiras em cima dos estofados e tapetes,
não alimente vaidades e suspeitas,
seja ti, mi, e eles,
contentes ou descontentes feitos em desfeitas.


tenha a poesia presente,
a música,
a literatura de vestibular e a já formada há anos,
porque de tempos em tempos
um amigo há de chegar
e outro vai indo embora
sem nem perceber.

sexta-feira, 13 de julho de 2012


poesia anônima


tenho um mar de gente em mim,
gente forte, gente assim feliz,
veloz, atroz, gente como a gente,
que sente, que corre atrás,
que vai por mim
que vai, não vai.


tenho um bicho aqui dentro,
bicho carpinteiro,
quase me arrebento 
tentando saber o que tem que me invade,
me dá saúde,
verdade,
me dá desespero,
lances novos,
coisas velhas,
telhas e versos,
trecos,
coisas de flor e bem querer.


tenho o mundo em um lápis,
caneta,
sangue,
imagens,
alarde, arde
só de pensar o que me dá.
escrevo com tudo,
com tudo que der,
sou anônimo que sabe o que quer,
ninguém me conhece, 
nem há de saber,
o quanto é estranho saber tanto porquê.


me dá tanta saudade de quando era assim, 
viajando e caminhando sempre pro mesmo lugar.


ouço vozes na cabeça,
na memória encontro fatos,
me refaço em páginas,
sou um papel dobrado,
sou anônimo, enfático,
sou reumático e traumático,
de "áticos" e "ônimos"
faço meu nome.


(o sono sempre me traz motivos pra acordar).

quinta-feira, 12 de julho de 2012

ambientes e interiores

da janela da sala vejo romances,
nuances, cores,
amores e desamores,
morenas, sabores,
mortes e vidas sem vida
passando por debaixo da janela.
vejo cida, maria e gilda,
confabulando sobre o preço do pão,
não abrindo mão de seus trocados.

da janela da cozinha vejo e sinto cheiros,
passo fome, como bois inteiros,
depende do dia, depende da tia,
depende de boa vontade.
mendigo uns trocados,
como doces e amargos,
vejo alegria num café quentinho.

da janela do quarto vejo sexo,
sem nexo, intenso, tenso,
rostos quentes, silhuetas,
lunetas espionando,
olhares por todos os lados, cantos,
falo baixinho,
não acordo ninguém
com barulho de descarga.

da janela da alma
abro várias portas,
escancaro-me,
solto as maçanetas do pudor.
chaveiro sou,
entrando sem pedir,
saindo sem saber,
me desgraço em ter tantas chaves
e não saber em que porta bater.
nordeste mal retratado

numa cidadezinha de recife
alguém brinca de ser gente
antes do por-do-sol.
antes que venha o sol queimando as cabeças
e as esperanças.

naquela cidadezinha crianças corriam
vitoriosas de estarem ali,
simplesmente tendo ar e dor.

numa cidadezinha qualquer do recife
tem barulho de televisão sintonizando,
e o radinho velho toca alguma coisa.

é a vida chegando?
sonho

às vezes fico pensando
que nesse mundo só há fantasmas vivos,
livres são, mas com luvas de seda,
não tocam em nada, não creem,
não tem certezas,
nada são para qualquer manhã.
às vezes invento estórias,
conto,
reescrevo a história do mundo,
vislumbro um fim,
assim sem mais nem menos,
rabisco, escrevo,
me dou esses luxos todos,
não tenho modos,
vim para ficar.

às vezes tenho saudades,
de algo que dói o peito,
suja as mãos,
e limpa da testa beijada o batom,
simplesmente o tom de voz,
uma vila entranhada de valores estranhos.
uma vila de seres humanos,
onde se encontra o coração.

às vezes reecontro pessoas,
tão estranhas quanto um estranho.
não me identifico com todos,
sou anti social embaixo d'água,
atrás das portas,
paredes,
cores mortas,
sombras me invadem e saem de perto,
indivíduos, trajetos,
não lembro mais quem.

às vezes eu fico pensando,
que nesse mundo só há fantasmas vivos,
passeam arrastando correntes,
arrastando lembranças,
sujando mentes,
tão descrentes de si mesmos,
que existem, sim,
mas não vejo,
existente sou, em desprezo
a eles.

entre nós,
o que se passa na cabeça antes de dormir?
cosmogonia
às vezes penso que o mundo inteiro foi feito de mim,
um pedacinho aqui, outro ali, e ele foi feito assim.
na perfeição que hoje contemplamos
e vamos juntos assistir o fim,
estou chegando perto da minha explosão.

que se dane o mundo.
o bater das asas

um som baixinho eu ouço,
pousa a gaivota lá fora.
onde será que ela mora?
no céu que não é,
pois bate as asas mas também anda a pé!
quem será que viu a gaivota?
traz meu coração que nem mesmo voando a gaivota quer.
alegre

um rapaz faz comida para seu amor.
corta batatas, cebolas,
refoga as coisas,
joga no fogo,
põe a mesa e uma flor fica entre ele






e o abismo que é Carlos.
(se fosse Maria, todo mundo ia entender)
efemeridades, dívidas e vida

agora foi o velho Jorge,
ontem, o nestor da padaria,
meus pais só o pó,
na lápide os dizeres automáticos
e um caixão dividido à prestação.
às vezes parece que tudo vai morrer
menos eu.
e eu só posso mesmo insistir.