segunda-feira, 28 de junho de 2010

As estórias do bonde de Sta.Teresa

o movimento do bonde incomoda as meninas
donzelas, vadias, de bolsa na mão,
o guerreiro tardio, empregado aguerrido
querendo saber o que temos na mão,
a favela inteira, o negrinho, a rameira,
a beleza do Rio de Janeiro em vão,
todo mundo atrasado, o bonde lotado,
vai saindo a beça, gente do vagão.

E esse sofrimento, ritmo intenso,
querendo e querendo ter só um irmão,
e ninguém aparece, o bem se esquece,
que o mal impede o amor de verão,
e a vida levada, surpresas arcadas
com esse suor, e o sangue derrama
e o cansaço inflama o pé da mulata,
e essa negritude, querendo cantar,
arrumou um lugar, pra de fato expressar
essa consciencia, tantas diferenças,
e o fato de apenas não ter mais as crenças
que um dia tentou ensinar.

E que época fria,
certezas tão minhas,
dentro do vagão,
de arma na mão,
me entrou um calango
e saiu atirando,
acertou o operário e depois foi vazar.
a polícia entrou gritando e fez o serviço
que não vai voltar,
entrou também atirando,
um após o outro, depois foi pro bar.

O suspeito cansado,
de tanto atirar,
molhou a goela naquele pé sujo.
Imundos defuntos agora tão mortos
quanto em vida aparentavam estar.
encontrou a polícia do lado de lá,
que suspeito nenhum haveria de encontrar,
ficaram amigos, pagaram bebidas
e a impunidade reinou, reinará,
até que o bonde pare de funcionar,
e a alegria do povo não tenha mais fim,
mesmo com problemas sorrisos sem fim,
e dentro dos sonhos,
terrenos tão loucos,
aquele bonde apareça pra mim.

O bondinho não existe mais,
poemas rimados não se fazem mais,
e os ritmados, cansados, sem paz,
não querem nunca sair mais,
nunca mais sair
dessa mesma tristeza,
na qual o poeta mergulha as palavras,
infames, ingratas querendo acabar.
O metrô, o taxi, o ônibus,
cheios de pessoas querendo chegar,
à alguma altura da vida,
na qual nem todos conseguem estar.

E se a polícia aparecer?
e se um calango quiser virar macho?
nesse pau de ferro ou peixeira cantar,
mais fácil cantar pra subir pro inferno.
E nesse poema sem fim,
retrato minha indignidade,
indignação dessas meias verdades,
de sempre encontrar o talento nas piores mentes,
nas piores mentes que a jogam no chão.

Tudo que eu queria era ser carioca em paz e crente
chego à mais uma estação.

2 comentários:

  1. você não cansa de me surpreender não? rs
    Seu poema me fez viajar, me fez pensar .. eu adorei, como adoro todos os outros. Belo talento, Parabéns! :D

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