quarta-feira, 4 de outubro de 2017

não tem título, mas tem amor

me visto de gestos imperceptíveis 
pra disfarçar o nervoso
tudo é novo
e eu suo,
é evidente que suo,
por trás das minhas perspectivas há o desespero 
de não querer.
por trás dos ombros eles vem e vão,
quem sou eu nessa confusão,
um instrumento do acaso (já ouvi isso em algum lugar),
um termo numa equação indecifrável.

me invisto em roupas caras e presença,
o sorriso falso até os lóbulos,
uma expressão terrível,
um copo de uísque tremendo enquanto ouço o conjunto de jazz,
ela vem,
inabalável,
o cabelo esvoaçante,
câmera lenta, não é filme,
não tem vento,
vem descalça
descansada,
ao luar.

eu olho pra mim mesmo
já me arrependendo.
bebi demais,
sofri demais na vida,
me tenho em grande estima demais,
humildade, não tenho,
terra plana, acredito,
alienígenas já vi,
chupa cabra,
etc,
quem iria imaginar isso,
ela professora,
mestrado, doutorado no exterior,
os caralho,
eu na firma,
junior,
senior,
demitido pelo tempo,
talvez tenha feito muito pouco caso dela.

ela ali, olhando pra mim, incrédula, aposto.
é isso mesmo? o gordo, meio calvo, no bar?
ela pensava tudo isso,
“não acredito que meu samba só dependa de você”
ela falou rindo e eu agradeci aos deuses por conhecer joão gilberto
me faz parecer menos imbecil aos olhos daquela deusa.
àquela altura eu ria, e o papo rindo “saudade fez um samba em seu lugar, benzinho”,
ganhei, achava, nem lembrei dos tempos que eu tinha pandeiro.

a noite acabou feito a cerveja,
ainda tocavam samba de orfeu quando eu falei que ia pegar o carro,
o cheiro dela em mim, 
todo em mim,
só tinha ela na vida agora,
mais nada.
arrumei briga,
bebedeira,
subi ladeira
fui atrás,
briguei,
dei mais de mim,
pedi mais,
levei o sorriso dela onde fui
sem querer saber se tinha fim,
aí quando ela for embora eu não me pergunto
se eu fui também,
ou fiquei sem mim.

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