segunda-feira, 6 de julho de 2015

as fotos

me peguei olhando fotos dos outros
como se fossem minhas
me fiz presente em suas experiências,
me alimentei de suas esperanças,
seus sorrisos,
suas lágrimas de felicidade,
sua ansiedade.
seus familiares eram os meus,
papais,
mamães, 
irmãos,
todos meus.
guardava em meu coração momentos tão alheios
de pessoas tão alheias,
algumas até desconhecidas.

fico ali,
estático
como um velho lembrando de outros tempos,
tempos mais simples,
sem fantasmas
nem sobrenomes,
sem sobremesas
ou telefonemas.
simplesmente estive ali outras tantas vezes,
batendo aquelas palmas,
lendo os mesmos poemas
já cansados,
superados e datados
(se é que podemos dizer isso de poemas).
e me imagino entre eles, os alvos de minha vida vazia
sonhando com meu futuro ao lado deles,
sonhando com eles em meu futuro
calado,
ceifado de qualquer emoção.

encontros, apertos de mãos,
olhando as tais fotos
pude ver que meus momentos surgiram em convergências,
divergências e urgências,
convergências com os enredos,
divergências com meus segredos
e urgências pelo que não tive
talvez nunca vá ter.

ao virar uma delas vi datas,
assinaturas,
nada de extraordinário pra mim,
mas era tudo tão mágico.
inventava aniversários,
bodas, casas grandes,
não essas bobagens de grandes apartamentos em condomínios onde ninguém se conhece,
casas com cachorros e roseiras,
vento, redes balançando e vizinhos barulhentos.
nas fotos eu inventava as realidades e "dez 1996", "janeiro 2004",
eram meus fios condutores,
meus fantoches e meus cenários recém criados.
aquelas datas e lugares eram sim, meus.
de direito,
imagem e ação.
e eu mergulhava nos espelhos que refletiam sentimento.

olhando fotos dos outros me apropriei deles,
por um momento olhei e me vi,
me perguntando se seus negativos me traziam as respostas que tanto queria.

me via ali e não vivia,
assim como minha vida vivia, 
e nada via.
um brinde à solidão
e ao sólido.

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