sexta-feira, 24 de julho de 2015

a cópia

fiz uma cópia de mim,
foi assim, sem mais nem menos,
não comia, não dormia,
era eu,
mas não sonhava
era cheio de manias,
mas não tinha esperança,
era minha companhia,
uma alma de criança.

a cópia era frágil e falhada
como as horas
os dias,
o tempo todo eu contava nos dedos
o tempo de voltar pra cópia,
me ver gêmeo sem ser,
me ver monstro,
viver.

fiz uma cópia de mim,
e outra
e mais outra
e as cópias foram por aí,
sendo eu e tantos outros,
criando amores,
inimigos,
subindo ladeiras e morros
tendo sentimentos,
evoluindo.

de repente tinha um milhão de mim
e era um tal de você fez isso
fez aquilo,
fez aquilo outro
não era eu, respondia encabulado
era uma cópia,
não tenho culpa,
como os outros veem a mim mesmo quando não estou.
ninguém entendia.

fui pra cadeia pela cópia,
fui currado pela cópía
transei e fui transado pela cópia
e até hoje não entendi o porque
quanto mais me copiava
mais triste,
mas livre,
mais desgraçado.

um dia copiei o meu amor,
não era a mesma coisa,
era perfeito,
era tão guardado a sete chaves
e tão cheio de mim
que tinha todas as cópias numa só
me apunhalou
e eu morri.
sistema

por um lado os lábios, o vento nos cabelos soltos,
o extenuante esforço de manter-se concentrado,
o verso escrito,
o tempo,
era tudo contra
e de repente as costas, nuas,
assim mesmo, desesperadamente de repente
o beijo
e o que era aquilo,
suor
dor de cabeça,
a boca seca (mencionada em tantas outras vezes e ocasiões)
tontura,
um monte de palavras soltas
as ideias,
outras,
sorrisos
e todo o resto
que ainda faltava descobrir.

sexta-feira, 10 de julho de 2015

gestos e gostos na calçada
um só coração pulsante,
e eu ali,
admirava tudo aquilo.
que sei eu sobre as pessoas?

segunda-feira, 6 de julho de 2015

as fotos

me peguei olhando fotos dos outros
como se fossem minhas
me fiz presente em suas experiências,
me alimentei de suas esperanças,
seus sorrisos,
suas lágrimas de felicidade,
sua ansiedade.
seus familiares eram os meus,
papais,
mamães, 
irmãos,
todos meus.
guardava em meu coração momentos tão alheios
de pessoas tão alheias,
algumas até desconhecidas.

fico ali,
estático
como um velho lembrando de outros tempos,
tempos mais simples,
sem fantasmas
nem sobrenomes,
sem sobremesas
ou telefonemas.
simplesmente estive ali outras tantas vezes,
batendo aquelas palmas,
lendo os mesmos poemas
já cansados,
superados e datados
(se é que podemos dizer isso de poemas).
e me imagino entre eles, os alvos de minha vida vazia
sonhando com meu futuro ao lado deles,
sonhando com eles em meu futuro
calado,
ceifado de qualquer emoção.

encontros, apertos de mãos,
olhando as tais fotos
pude ver que meus momentos surgiram em convergências,
divergências e urgências,
convergências com os enredos,
divergências com meus segredos
e urgências pelo que não tive
talvez nunca vá ter.

ao virar uma delas vi datas,
assinaturas,
nada de extraordinário pra mim,
mas era tudo tão mágico.
inventava aniversários,
bodas, casas grandes,
não essas bobagens de grandes apartamentos em condomínios onde ninguém se conhece,
casas com cachorros e roseiras,
vento, redes balançando e vizinhos barulhentos.
nas fotos eu inventava as realidades e "dez 1996", "janeiro 2004",
eram meus fios condutores,
meus fantoches e meus cenários recém criados.
aquelas datas e lugares eram sim, meus.
de direito,
imagem e ação.
e eu mergulhava nos espelhos que refletiam sentimento.

olhando fotos dos outros me apropriei deles,
por um momento olhei e me vi,
me perguntando se seus negativos me traziam as respostas que tanto queria.

me via ali e não vivia,
assim como minha vida vivia, 
e nada via.
um brinde à solidão
e ao sólido.

sexta-feira, 3 de julho de 2015

autonomia

era triste.
o tempo das desesperanças
finalmente tinha chegado.
mais que o vivo e o simples
era simplesmente o triste
e tudo nele contido
(principalmente os amores quebrados e as dúvidas)
sim,
parecia sem ter solução,
mas tudo tem o fim desejado
e as mudanças ocorrem junto com aquilo que ajuda a crescer as unhas e os cabelos.
era triste,
nas agora já nem me lembro,
o que antes era tão dentro de mim, foi engolido,
fagocitado
pelas alegrias subsequentes
eu tenho o peso do mundo nas minhas escolhas
e não só isso,
como também o contrário,
e nesse contrato que faço diariamente
com teu deus
ele me livra de alguns impecilios,
não sem antes me ensinar algumas lições.

era triste
e no verbo me fiz pretérito
e preterido pelo mundo inteiro
me fiz ferido
preferido de mim mesmo,
como deve ser.

era triste,
mas nos adjetivos me escondi o quanto pude,
vendo filmes e sonhando ser protagonista,
tramas, belas damas e vistas
rimas no meio do nada me davam risada
e era gostoso rir, mas podia acreditar.
mas fiz o que quis dos meus dias,
e assim mesmo pude ser dono do meu próprio medo.