sábado, 9 de janeiro de 2016

tabagismo

ando fumando muito
a estrela da manhã de Manuel bandeira presente em meus pulmões

morreu. escureceu. parou de brilhar.
eu

era um recomeço
sei lá, eu tinha medo
nunca tive tanto medo
de ser eu mesmo
de me abrir pro mundo,
sair do mundo,
me libertar das paredes do meu quarto
eu tinha medo
medo de escrever e não gostar
medo de viver,
medo de amar,
medo de um monte de coisas.
mas era um recomeço,
comecei pelo ponto final,
agora tinha que correr atrás das virgulas e dos versos
e os pobres coitados nesse calorão de janeiro
nem sabem de nada

eu não sou nada.
passaporte pra vida

outro dia eu li num outdoor
“passaporte pra vida!”
era alguma ideia maluca de auto ajuda
mas aquilo me fez pensar.
e se a gente vive numa espécie de país, que é outra coisa
que não é a vida
porque se fosse a vida não tinha a coréia do norte.
não, quer dizer, vai ver tem coréia em tudo que é lugar e a gente não sabe
é que nem uma cilada,
um looping eterno de desinformação.
mas o passaporte pra vida do outdoor me fez pensar.
desculpa, coréia, pensando melhor agora foi sem querer
o seu nome ia ficar diluído em outros nomes e agora pareceu deselegante,
mas se bem que não tô preocupado,
tem quem me defenda (...)
ah, não tem?
bom, eu nem moro no mesmo lugar,
o que vou fazer?
não ter opinião?
acabei de criar a maior metáfora do universo
e nem tô tão orgulhoso assim,
deixa pra lá, deixa eu voltar pro assunto,
e se tudo isso for outra coisa
e a gente tá perdido
com o passaporte pra vida preso em algum lugar de burocracia?
afinal pra que existem as burocracias
eu vivo na morte?
cadê o avião pra me levar embora?
tá tudo muito caro aqui,
é difícil viver,
é difícil ver e até respirar.
seria legal um avião pra me levar embora.
pra sair daqui vou pra qualquer lugar
e abraço genocidas norte coreanos só pra ter pelo que viver.
autoconhecimento

dizem que o tempo é precioso
mas eu nunca gastei tempo suficiente pra saber,
nunca troquei o tempo
escravizei ele,
lucrei com ele.
o tempo é mais uma visão distorcida,
como um sonho ou algo assim.
sim, eu sou capaz de sonhar com o tempo
de ver o que já foi (na lembrança)
de ver o que ainda vai ser (na esperança)
de ser o que eu ainda quero
mas ainda não tenho certeza.
o tempo é só o tempo
não é de ficar analisando
mas é muito difícil aceitar o tempo sem saber da gente.
livros e perfumes

abro livros e perfumes.
os perfumes espero evaporarem,
pra levar meus cheiros por aí,
deixar uma marca no mundo feroz,
quem sou eu
os livros finjo que leio
mas por cima tem sempre uma revista de mulher pelada,

pra mostrar quem somos realmente.
retorno

me recuperei de um coma profundo
e enquanto “dormia” refletia sobre coisas profundas,
elaborava listas das quais obviamente não lembro
fazia canções as quais não ouso cantarolar.
lembro que o tempo foi infinitamente gasto
e maravilhado estava no meu transe cheio de significados
e amores e beleza
acordo pro vazio,
por deus, me mande de volta
nada fiz pra isso merecer.
não gosto daqui,
não gozo,
não creio.

por deus.
reflexões de amor e sexo

orgias são coisas engraçadas
recentemente fui acusado de ser poliamoroso
e não entendi o neologismo
não entendo palavras novas a não ser que eu ou Guimarães rosa
as tenham inventado
poliamor, mané , poliamor, respondi,
o que há de ser tal coisa?
você gosta de um monte de gente ao mesmo tempo
eu gosto de todo mundo, retruquei
esse egoísmo é seu
mas o mundo é mais
o mundo me oferece tanto
e eu choro em retribuição
por não haver tempo para aproveitar.
e vem o silêncio.
meu amor não é dividido
eu amo e amo com a intensidade de mil sóis
mas agora aqui me vejo confuso
com rótulos, com versos, com tudo
e me desespero ao chegar ao clímax (ou anticlímax)

orgias são coisas engraçadas.
escolha

tenho pôsteres não emoldurados
enrolados e guardados em minhas estante.
não exponho minhas vergonhas e nem minhas palavras,
não me vejo abrindo tão cedo
molduras são caras,
tão caras,
não há dinheiro no mundo que pague.
lá, pegando poeira
eles contam a própria história,
contam a próxima vítima,
o próximo trailer de um filme espetacular.
estão lá, só eu sei deles.
um papel pardo os envolve
e só eu sei deles.
pra mim me basta.
vejo suas imagens o tempo todo
e me abrigo dos perigos de verdade.