terça-feira, 30 de junho de 2015

encontro

boca a boca
o beijo tímido
intenso, vívido,
a lembrança daquele dia
ainda em mim
quem aceitaria esse destino
se tivesse outras alternativas.
o sorriso se vai
calado
como a casa dobra e eu diminuo,
sufocado
o amor é ontem.
engulo a pílula e vejo coisas
quem é?
mania, macias as roupas
tecidos
quem é
escrevo e leio
nada presta
mas tento assim mesmo.

é como respirar,
a gente tenta e sobrevive
de sobreaviso.
reza

encontrei perdão sem ter pecado
era magro, casto e desgraçado,
o que há com esses sonhos?

sempre os mesmos fantasmas
de capuz e capa,
aterrorizando tudo,
gritando,
eu imundo hoje,
amanhã não sei,
talvez
encontrei perdão sem ter.

pecado.
memória

enquanto a vida sorrir
e a incapacidade de ver o outro
e seus problemas
se fizer presente,
aqui vivo então.

tenho alma
pois um dia sussurraram que sim
no meu ouvido despreparado,
mesmo sem sentido eu vivo,
revivo valores dos antepassados
e trago as malas antigas
cheias de pó e lembrança.

enquanto a vida sorrir
nada dói.
nada é tão grande assim

quinta-feira, 25 de junho de 2015

rei

gerava os gerânios e o pavor,
era arauto da justiça, da dor,
os verbos, os versos, a cor,
as trevas, os regressos, o calor.

e  foi-se embora tua rima
num só salto,
de surpresos em surpresos
os imbecis comentavam "quem era?",
minha vida era só aquilo mesmo,
não tinha peso,
não tinha grandes expectativas,
não tinha cheiro de bolo quentinho
nem alegrias ou versos dentro dos bolsos.




segunda-feira, 1 de junho de 2015

tragédia

quando tua mitologia
encontrou a minha
os deuses riram,
recém criados.
e banquetearam ao som das liras,
nos abençoaram,
invejavam nossa felicidade.

quando tua mitologia
encontrou a minha,
saudade era nossa morada
o verso era curto
as horas longas
zombavam nossa união

quando tua mitologia
encontrou o fim
foi assim,
como na tragédia,
máscaras,
coro,
corifeu,
julgavam-me todos,
o sangue nas mãos,
os olhares de reprovação,
os estranhos.

quando minha mitologia
encontrou seu fim
animais choraram,
e monstros emergiam
caminhavam por sobre as águas,
eu apenas clamava perdão.
espírito

está terminantemente proibido morrer

os ventos que sopram suaves,
as praias brancas,
o tempo corre devagar,
as virgens,
os virgens,
a pureza,
nada mais será usufruído.

está proibido morrer.

e quem ousar, desobedeça,
faça e aconteça,
é o calor do momento,
a responsabilidade,
a tristeza,
sentimentos tão comuns aos vivos
que lhe absolverão.

está proibido morrer.

sinto-me chamado pelos anjos
ou quem quer que seja.
o cheiro das flores,
os medos,
as febres,
os desejos,
se vão como a primeira luz da manhã.
a poesia diz que não posso ir,
não posso percorrer os caminhos para meus antepassados,
não posso sorrir diante deles,
aprender com eles.

está proibido morrer.

vivo por um fio,
a agonia,
o verso,
a maestria da escrita,
as tribos esquecidas,
as minhas gravatas.
quanto tempo gritei por socorro,
quando foi que me atentei à vida?
agora me seguro a ela
e tremo,
estão todos em volta,
adormeço
não,
luto contra o sono,
seria o último
e com um raio de sol,
abro os olhos.
estão todos gargalhando
"é alguma piada, com certeza"
não, dizia meu bisavô que jamais conhecera.

está proibido morrer.