quinta-feira, 11 de novembro de 2010

poesia de guerras e infernos

um soldado maroto e covarde
que vivia com um sorriso no rosto
e a arma na mão,
pisou numa mina
e foi conversar com Deus.

"dei meu braço esquerdo
em sangrenta batalha
e diversos cortes tenho pra mostrar,
sou sujeito homem,
sei matar tão bem
que acabei sendo perseguido por meus inimigos
e fui morto pelas costas numa emboscada."

era mentira, claro,
o soldado tinha se perdido do pelotão
em treinamento de guerra e descuidade que era
pisou numa mina falsa (ao menos achou que era)
e explodiu que só ele podia achar os pedaços.
mas envergonhado e na frente de Deus devia inventar coisas
mais heróicas e contou esta anedota.

"Deus não gosta de mentira, nem de guerras, meu filho"
e o soldado se desesperou,
tentou escapar de seu próprio destino.
mas já era tarde.
então, pesaroso,
Deus o mandou para o Diabo que o quisesse carregar,
na ponta do tridente
e ele foi.
pegou o elevador dos anjos
e saltou no andar de baixo.
o cheiro era incômodo e ouvia gritos,
mas tratou de se aprumar
e começou a achar tudo muito engraçado.

chegando aos infernos,
foi tirar satisfação.
e o sete pele foi logo lhe calando a boca:
''sou eu quem faz as perguntas,
meu querido soldadinho de chumbo,
vamos às anotações."

E o demônio começou a falar:

''mentiroso, patife, traidor,
canalha, medroso, maluco,
imprudente, dependente, descuidado
e ainda por cima covarde?''

"derrotado, sem dente,
sem braço, sem mulher
sem vida, sem arma,
se farda,
pelo amor de Deus, quer dizer, cof,
pelo meu amor, que fazes aqui?''

o soldado explicou tudo direitinho,
como havia lutado grandes guerras,
como havia sido vítima de emboscada,
sobre como dera o sangue pela pátria
e sobre todos os homens que matara sem dó.

Era mentira, é claro, como todos já sabem,
mas lá embaixo era diferente,

o do tridente, com lágrimas de orgulho nos olhos,
tratou de alocá-lo na suite presidencial com todo luxo.

e lá ele permaneceria junto dos seus,
aproveitando o sofrimento eterno.
contesto o texto
e atesto o teste
da textura transloucada
da loucura dos trajetos e
os temores de criança
e as crenças de comedido.

calado eu me dou um trato,
escrevendo eu tenho tempo pra chorar
Ditadura Militar

injustia insana,
quê isso?
me algemaram em casa outro dia
e me levaram embora.
sem nem perceber
me trouxeram de volta.
sem nem perceber
minha mãe era morta,
sem nem entender
meu pai deu uma volta e eu fiquei.

injustiça insana,
quê isso?
me pegaram em casa e me bateram,
e eu nem pude defender o corpo.
sem ter pr'onde ir fiquei sem sorriso,
sem ter pr'onde ir
me chamaram de liso.
sem ser nem sorrir
já não tenho mais nada.

injustiça insana,
quê isso?
acordei em outro país outro dia,
e Che tá morendo do outro lado do mundo
que no fim não era mesmo Raimundo
e não pôde contar essa história,
desapareceu misteriosamente.
o grito

AAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAH!

soltei um grito,
nem de medo nem de nada,
chega dessa palhaçada,
poema rimado é mito...

e fiquei louco
pelo grito e o poema,
quem mexer no meu morfema
vai acabar ficando rouco.

perdi a voz,
junto dela foi a rima,
junto da rima a risada,
e tá acabada a poesia.
estilo

precisei pensar bastante
antes de escrever este.
pensava antes que a poesia
deveria ser certinha, robótica,
sem estilo e usando pijama de seda,
mas não.
pensei e pensei e pensei,
e aí então pensei de novo.
palavras viraram versos,
versos viraram estrófes,
estrófes viraram nada
e temos um poema ridículo,
uma metalinguagem forçada e sem uso,
de um escritor estúpido, talvez bêbado
e levemente impotente.
esse é o estilo em que me encontro.

forte, cheio de coragem e nenhum pijama.

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

futebol

Danilindo, pra ti

a bola rola
rola a bola
a rota em volta
volta e meia
rola a bola
e não enrola.
então não rola
desenrola
e rola essa
e aquela bola
e a nossa bola
quem que rola
se não rola
não tem jogo,
se não jogo
o jogo todo
em todo o jogo
a bola rola.

terça-feira, 2 de novembro de 2010

um verso que vai

fazer o que, ele quis ir embora e eu deixei
prender um verso contigo é a morte dele
vai perder a beleza e a cor,
e vai ganhar uma dor de dente.

como eu quis que ele ficasse aqui
e do meu lado ele perdesse o fôlego
mas poesia sem o devido cansaço
é a poesia sufocada em amor.

fazer o que, ele quis ir embora e eu deixei,
e com isso foram-se as esperanças
de que minha inspiração fizesse chover
e que minhas saudades virassem lembranças
a separação dos caminhos

Rosangela Espósito Gonçalves.

a separação dos sentimentos,
a separação dos tormentos,
a separação dos amores,
a separação da confiança,
a separação da cumplicidade,
a separação da amizade,
a separação dos sorrisos,
a separação das moradas,
das mobílias,
das falácias,
as separação das idéias,
a separação dos dois mundos...
a separação dos fenômenos,
a separação das moralidades,
a separação dos medos internos,
o grito severo de liberdade,
o alcance da maioridade,
o avanço das tantas maldades,
ah! que maldades,
tão envolvidas,
tão mortificadas.

a separação das crianças,
a separação da família,
o lar quebrado em dor,
onde se tenta com amor
maquiar o inevitável.
as visitas semanais,
os entraves morais,
o terror noturno.
os pesadelos.

é como um rio corrente
que vai dar pro mar,
nunca sabemos o que encontrar,
mas há sempre aquilo que nos faz sentir
tão bem,
e ao mesmo tempo, perdidos,
pedindo aos céus por ajuda divina
divindade carinhosa e tenra,
que nos protege do que vem seguindo.

a

s
e
p
a
r
a
ç
ã
o

d
o
s

c
a
m
i
n
h
o
s
.
um verso.

um verso e meio,
um verso inteiro,
um verso teu e
um verso meu.

um verso livre,
um verso preso
um verso intenso
e um verso ateu...

até mesmo a poesia disse adeus.